Desmatamento do bioma cerrado cresce e atinge índices nunca vistos
- Katia Torres
- 2 de out. de 2024
- 4 min de leitura
Atualizado: 8 de fev.
Letícia Lanes

No primeiro semestre de 2023 o desmatamento do Bioma Cerrado atingiu níveis alarmantes atingindo 491 mil hectares. Esse número representa um aumento de 28% em relação ao mesmo período no ano passado, quando foram desmatados quase 383 mil hectares, segundo dados detectados e confirmados pelo Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado (SAD Cerrado).
O Cerrado é o segundo maior bioma da América do Sul e do Brasil. De acordo com o IBGE, cobre cerca de 23,9% do território nacional, perfazendo uma área entre 1,8 e 2 milhões de km2. É considerado a mais diversificada savana tropical do mundo, possuindo milhares de espécies animais e vegetais em grande parte endêmicas, ou seja, só existem neste bioma.
Apesar de tamanha importância, é o mais ameaçado dentre os biomas, sendo cobiçado para a agricultura, negligenciado pela legislação, menosprezado pela Constituição de 1988, já que somente em 2020 se tornou patrimônio natural do Brasil.
A conscientização ambiental, por parte da população, pode mudar este cenário e algumas organizações sem fins de lucro ajudam neste processo. Segundo Reynaldo Brito, da ong Greenpeace, que deixou a profissão de Analista de Sistemas e hoje é coordenador do Grupo Bioma Cerrado,
Situação atual
Atualmente o Brasil abriga dois hotspots de diversidade, a Mata Atlântica e o Cerrado. O termo "hotspots" quer dizer que o Cerrado é uma região que abriga um alto número de espécies vegetais e animais que não são encontrados em nenhum outro lugar do planeta, mas que está ameaçado por já possuir menos de 30% de sua vegetação natural.
Outro aspecto que agrava o quadro ainda mais é a antropização, ou seja, os resultados da ação humana sobre o meio ambiente, como as técnicas de cultivo inadequadas, como o uso intensivo de máquinas, a utilização de agrotóxicos e a não rotatividade das culturas produzidas no solo e que vem ocasionando o esgotamento dos nutrientes.
Por fim, a extinção de nascentes (ou cabeceiras) de rios e menor recarga dos aquíferos, a compactação do solo e a erosão, aceleram a desertificação e promovem a extinção de espécies de animais e vegetação endêmicas e a poluição dos solos e dos corpos hídricos.
Ações afirmativas
Segundo especialistas, é possível conciliar produção agrícola com a preservação ambiental. Um bom plano de zoneamento das áreas degradadas, por exemplo, pode ser efetivo no combate ao desmatamento. “Um plano de aproveitamento (...) de áreas que hoje estão ineficientes, pode ser uma virada de chave, já que promove o manejo sustentável sem que o produtor tenha que buscar outras para pastagem do gado”, explica Vicente Junior, engenheiro florestal, mestre e doutor em Ciência Florestal na Universidade Federal de Viçosa (UFV)..
Outra ação afirmativa, que no parecer do ambientalista é promissora, é a consolidação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), novo Código Florestal, que funciona como registro público eletrônico obrigatório para todos os imóveis rurais, de âmbito nacional e que tem como objetivo unir e padronizar todas as informações ambientais das propriedades e posses rurais. O controle do desmatamento é feito através de imagens captadas por um satélite, sendo assim possível identificar as áreas de preservação permanente (APPs) e de reservas legais em cada propriedade, bem como acompanhar a recuperação da cobertura vegetal onde a lei exigir.
Além disso, o Programa de Regularização Ambiental (PRA) também desempenha um papel significativo ao motivar os proprietários de terras a regularizar, recuperar e compensar áreas de preservação, oferecendo benefícios como acesso a crédito rural e suspensão de multas enquanto as ações sugeridas são cumpridas. Essas iniciativas são essenciais para a conservação do cerrado.
O Consórcio Cerrado das Águas (CCA) é também uma ação afirmativa importante no combate ao desmatamento do cerrado. Ele colabora entre empresas, o governo de Minas Gerais e a sociedade civil, visando orientar e incentivar os produtores a adotar práticas de agricultura inteligente para preservar a vegetação nativa e melhorar os recursos hídricos do cerrado.
Outro recurso inovador em tecnologia é o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) que realiza monitoramento mensal e automático que fornece alertas de supressão de vegetação nativa em todo o bioma Cerrado. O sistema utiliza técnicas avançadas de processamento de imagens do satélite Sentinel-2 (10 m de resolução) para detectar, validar e refinar os alertas, o que permite uma ação mais preventiva.
Se torna evidente, urgente e necessária, a intervenção governamental no processo de proteção e renovação deste bioma. O que deve ser feito através da implementação de legislações que garantam e/ou fiscalizem o desmatamento no Cerrado, atividades antrópicas dentro de sua área vegetativa, para que ocorra um equilíbrio ecológico entre o agronegócio e o meio ambiente. E principalmente, que a biodiversidade única do local não seja nem um hectare a mais, extinta.
Quilombolas e Terras Indígenas
Os povos indígenas e os quilombolas, tradicionalmente, sempre usaram os recursos naturais sem colocar em risco os ecossistemas. Estes povos desenvolveram formas de manejo que têm se mostrado muito importantes para a conservação da biodiversidade no Brasil e exímios cuidadores do Cerrado
Exemplo disso é o Quilombo Quartel do Indaiá, em Diamantina-MG, certificado como remanescente de quilombo pela Fundação Cultural Palmares. Segundo Seneca, liderança do quilombo, eles são vigilantes 24 horas por dia, do Cerrado Mineiro. “Eles, os fazendeiros vizinhos, não gostam muito da gente não. As pastagens de capim estão por toda parte. Mas nós não importamos com cara feia, não. Temos que cuidar da terra”, desabafa.
O Censo 2022 mostrou que 57.442 quilombolas residem nos 147 Territórios oficialmente delimitados titulados. Tal número é animador, já que em março de 2023, foram contabilizados 3.189 cadastros no CAR, totalizando 39.308,9 hectares.
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